Entretenimento
Chico César e Geraldo Azevedo apresentam a turnê “Violivoz” no Teatro Riachuelo, dias 30 e 31 de outubro
Tudo pode ter começado numa noitada de violão a dois, na casa de Chico César, em São Paulo, quando ele e Geraldo Azevedo pensaram, cada qual por si: “A gente bem que podia fazer isso para o público. Para os nossos públicos.”
Pode ter começado muito antes disso, quando Chico lançou em 1995 seu primeiro disco, Aos Vivos. Um CD que fixou uma impressão já latente em muitos colegas, um pequeno grupo de cantores, músicos e compositores que antes disso falavam: “Esse menino é muito bom, mas muito bom mesmo! Por que não faz um disco?”.
Admiração mútua nem sempre implica em identificação, mas a reunião destes dois artistas para o espetáculo Violivoz, que vai percorrer o Brasil este ano, mostra uma vibe em comum e um território comum de “inclinações musicais”.
“Temos pensado em canções onde a gente possa brincar com o instrumento”, diz Chico César, lembrando músicas como “Bicho de 7 Cabeças” ou “Meu Pião”. Canções que vão sendo testadas para o repertório, como também “Mama África”, “Dia Branco”, “À Primeira Vista”, “Menina do Lido”…
É o violão, a musicalidade, que os aproxima? “Eu acho que é o charme das canções”, responde Geraldo, aludindo a outra música do repertório. “A arte de compor, de trabalhar, de dar polimento à música até ver que ela ficou pronta… Acho que cada um de nós vê isso no trabalho do outro e se identifica.”
O caldo cultural em que ambos cresceram, apesar da diferença de idade, também conta. Começa pelo ouvido afinado com a música-de-rua “sertaneja” – Geraldo na pernambucana Petrolina, Chico na paraibana Catolé do Rocha. Um regionalismo (passando necessariamente por Luiz Gonzaga e Jackson do Pandeiro) que não precisa ser exibido, ambos já trazem entranhado na composição e no canto.
O Tropicalismo, também – que em momentos diferentes marcou a revelação musical em plena juventude. “O Tropicalismo estava em minha música muito antes de começar minha carreira solo”, lembra Geraldo. “Lembro de Gilberto Gil, ao voltar de Londres, mostrando as canções que pretendia gravar, como ‘Expresso 2222’; fizemos trabalhos juntos, havia uma troca musical que deixou muita coisa.”
Geraldo conheceu o trabalho de Chico César através de Carlos Bezerra, o “Totonho”, paraibano famoso pelo trabalho musical “Totonho e os Cabras”. Totonho era, tal como Chico César, uma “cria” do grupo de música de vanguarda paraibano Jaguaribe Carne, liderado em João Pessoa por Pedro Osmar e Paulo Ró. Os dois, Chico e Geraldo, tinham canções num projeto que não chegou a ser gravado, mas Geraldo, ao escutar as músicas de Chico, pediu que ele viesse gravar o violão.
“Quando algum tempo depois foi lançado Aos Vivos”, diz Geraldo, “pra mim foi uma revelação. Além das composições em si, o violão de Chico César buscava outros caminhos, com um estilo muito pessoal, que só ele seria capaz. Virei divulgador (risos)… Comprei duas caixas de CDs e saí distribuindo para as pessoas, dizendo para elas: Dá uma escutada nisso aqui, e depois me fala.”
A admiração tornou-se recíproca neste momento. Chico César, cerca de vinte anos mais novo, já acompanhava o trabalho de Geraldo – uma das figuras de maior presença na geração de nordestinos que se projetou na Música Popular Brasileira durante a década de 1970.
A verdade é que nem a geração de Geraldo nem a de Chico passou incólume pelo baião, pelo coco, pela Bossa Nova, pela Tropicália, a Jovem Guarda, o rock internacional, os ritmos latinos e caribenhos…
A “liga” proporcionada por cada uma dessas janelas musicais vai aproximando caminhos.
Geraldo agregou-se a Elomar, Xangai e Vital Farias no projeto Cantoria (1984, 1988; e numerosas turnês), da gravadora Kuarup. Depois, juntou-se aos companheiros de geração Elba Ramalho, Alceu Valença e Zé Ramalho para outro projeto bem sucedido, O Grande Encontro (1996, 1997, 2000 e numerosas turnês).
Espírito de partilha, de mutirão, de parceria… Chico César já dividiu palco e projetos em comum com estrangeiros como Ray Lema, Pedro Guerra, Pedro Aznar, Né Ladeiras… para não falar nos brasileiros de sua geração: Paulinho Moska, Zeca Baleiro e tantos outros.
O tempo é nosso. Não importa a geração, o ponto de origem, o possível destino final: Violivoz, como outros trabalhos na carreira dos artistas envolvidos, é um trecho, um trajeto entre duas estações, um percurso a ser cumprido, com suas surpresas, suas aventuras, a criação da beleza possível que sempre acompanha quem entra num estúdio ou sobe num palco.
Por Braulio Tavares