Sociedade
Setembro Amarelo: como lidar com o luto pelo suicídio de um ente querido
Em hipótese alguma devem ser adotadas posições de julgamento, possibilitando que os enlutados tenham sua dor respeitada
A Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP), em parceria com o Conselho Federal de Medicina (CFM), realizam a campanha Setembro Amarelo, desde 2014, com o objetivo de conscientizar a sociedade para a prevenção do suicídio. Dados da Organização Mundial da Saúde (OMS) revelam que aproximadamente 1 milhão de casos de óbito por suicídio são registrados por ano em todo o mundo. No Brasil, são registrados anualmente uma média de 12 mil.
Para prevenir o suicídio, é importante que a sociedade fale corretamente sobre o tratamento dos transtornos psiquiátricos, considerados as principais causas que levam uma pessoa a tirar a própria vida. Porém, essa realidade está distante, uma vez que o tema ainda é considerado tabu. Se falar de suicídio já é difícil, como ficam as pessoas que perdem um ente querido dessa forma?
De acordo com a psicóloga do luto do Grupo Vila, Beatriz Mendes, a dor e o sofrimento de quem era próximo de alguém que se suicidou carregam muitas particularidades. “A morte por suicídio é considerada inesperada, violenta e repentina. É um fenômeno cercado de tabu, estigmas, silenciamentos e mitos. Com isso, há uma atmosfera que dificulta a expressão do pesar e geralmente, os enlutados apresentam fortes sentimentos de culpa e têm muitas perguntas sem respostas”, explica.
Embora haja uma busca incessante pela causa ou culpado, é importante ajudar os enlutados na compreensão de que as reais motivações se foram com aquele que partiu. “Geralmente, são culpas irreais e que precisam ser acolhidas de modo cuidadoso para que, aos poucos, elas possam ser dissolvidas com dados de realidade. Mesmo que soubéssemos a motivação, isso não garantiria que compreendêssemos a dimensão da dor do outro a ponto de levá-lo a tirar a própria vida”, afirma a psicóloga.
O luto por suicídio é cercado de fatores que podem aumentar o risco do desenvolvimento de um processo traumático e duradouro. O preconceito diante da ocorrência dessas mortes pode fazer com que haja um silenciamento por parte do enlutado.
“Diante de um contexto no qual as pessoas não falam sobre ou, quando falam, abordam de maneira temerosa, punitiva e com julgamentos, geralmente faz com com que os enlutados se sintam invalidados em sua dor. Além disso, o cerco de silêncio que se forma pode parecer que o assunto é inadequado e facilita que os estigmas sobre o suicídio se fortaleçam. Como consequência, percebemos muitos enlutados que têm receio de falar e, até mesmo, vergonha por se sentirem julgados”, conta Beatriz.
O fato de a morte por suicídio ser um assunto delicado e muitas vezes, evitado, pode causar constrangimento quando há a necessidade de explicações de como se deu a morte do ente querido, especialmente em famílias com crianças e adolescentes em que comumente são atribuídas outras causas ou doenças para justificar a morte.
Segundo Beatriz, essas circunstâncias fazem com que o luto por suicídio se encaixe no que é chamado de luto não reconhecido. “A falta de suporte e acompanhamento podem gerar um desamparo significativo, resultando em maior intensidade no processo e impedindo possibilidades de ressignificação do acontecido. Também pode deixar o enlutado mais suscetível à possibilidades de desenvolver adoecimentos físicos e mentais”.
Para dar apoio emocional e conforto para quem perdeu um ente querido por suicídio, a primeira atitude é não se afastar dos enlutados na tentativa de protegê-los. “Muitos precisam falar e não encontram espaço e suporte social aumentando assim a sensação de desamparo e abandono o que aumenta sua vulnerabilidade. É muito importante abrir espaços de diálogo sobre o tema, além de estimular o enlutado a perceber quando é necessário recorrer ao suporte profissional.”, orienta Beatriz Mendes.