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Esporte

O futebol que fique para depois

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É desarrazoado e ilógico pensar em retomar o futebol agora

Foto: Gabriel Leite | Universidade do Esporte

A insistência na repetição de sinônimos serve para demonstrar o tamanho do despautério que é a retomada do futebol neste momento.

Olhando para o movimento da pandemia em outros países e baseado nas análises de especialistas, o Brasil está às portas do caos. São dois dias consecutivos com a taxa de mortalidade na casa de 600 vidas perdidas em 24 horas.

São 8.536 mortos em pouco mais de 50 dias após o primeiro óbito. O Brasil tem 125.218 casos confirmados com um crescimento médio de 9% ao dia de novos casos. Somos o 6º país no ranking de mortos e com a consciência de que, por falta de testes, temos uma subnotificação na ordem de 12 a 15 vezes o número real de casos, segundo estudos.

A taxa de isolamento social tem diminuído enquanto a taxa da ocupação em UTI’s está aumentando. Especialista recomendam o lockdown imediato em várias regiões do país como última tentativa de evitar uma tragédia sem precedentes na história brasileira.

Neste cenário catastrófico, o futebol tupiniquim se organiza para retomar as atividades. Como medida para viabilizar os treinamentos, o Flamengo testou as pessoas do círculo social do clube.

Foram 293 pessoas submetidas aos testes e o resultado é assustador: 38 casos positivos. Divididos em três jogadores, dois jogadores que têm anticorpos e não o vírus — tiveram contato com o vírus e se curaram — seis funcionários do clube, dois funcionários terceirizados e 25 familiares ou funcionários de atletas.

É a tal transmissão comunitária que o Ministério da Saúde alertava ainda em março. Quando é impossível definir onde estava caso zero.

Na última segunda-feira, o Flamengo assistiu à morte de Jorginho, massagista do clube fazia 40 anos. Aos 68 anos de idade, o funcionário morreu vitimado pala Covid-19.

Esse mesmo Flamengo — multicampeão na última temporada — demitiu e deixou desassistidos 62 funcionários em mais uma cruel mostra de desumanidade da atual diretoria que desde o desastre do Ninho do Urubu, esbanja falta de empatia.

Porém, há de se admitir que o Flamengo só serve como comparação, pois ao menos testou seu pequeno feudo. Pior fazem outros tantos que forçam a retomada sem ao menos mostrarem condições para minimamente garantirem alguma improvável segurança.

É tão disparatada a volta do futebol neste momento, que bastariam os números e o clima de luto que vive o país para justificar a paralisação total. Porém, quando comparados os momentos da epidemia na Europa e no Brasil, uma verdadeira loucura se desnuda na decisão de retornar aos treinamentos.

No mesmo dia em que clubes brasileiros retornaram aos centros de treinamentos, a Espanha permitiu que seus times também retomassem as atividades.

O país do rei Juan Carlos é o território com mais casos na Europa, o segundo do mundo e nos últimos dias viu uma concreta desaceleração nos casos de novos infectados e de óbitos.

A Espanha chegou a registrar em seu pico epidêmico, mais de 800 mortos num único dia e agora tem perdido cerca de 160 pessoas por dia. Ainda é muito, claro, mas há um indicativo de diminuição de casos. No Brasil, o movimento é o oposto.

Na Alemanha também acontece um movimento de retomada do futebol. Como comparativo, na semana passada foram testados 1.724 atletas de 36 clubes com apenas 10 casos positivos. Só o entorno social do Flamengo apresentou quase quatro vezes mais infectados numa mostra quase seis vezes menor.

É estapafúrdio pensar a retomada do futebol brasileiro agora.

É mais que absurdo. Tomar a decisão de retomar neste momento, ainda que apenas treinamentos, é assinar uma procuração em branco para o desastre.

Sem testagem suficiente, com várias capitais em claro colapso no sistema de saúde, com o mundo todo sabendo que a pandemia do novo coronavírus está fora de controle no Brasil e numa curva ascendente de infecção não se pensa nenhum tipo de retomada, se pensa medidas para combater a epidemia.

Por hora a bola para, o estádio esvazia e o futebol fica em segundo plano, porque o que importa são as vidas que podem ser salvas com o isolamento. Como diria o lendário treinador italiano Arrigo Sacchi: “il calcio è la cosa più importante delle cose non importanti“. Ou no bom e velho português:

“o futebol é a coisa mais importante dentre as coisas menos importantes”.

(Foto: Gabriel Leite / Universidade do Esporte)

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