Opinião
Para voltar ao mar
Lembro de ter ouvido diversas vezes que as conchas escondem o barulho do mar. Esse movimento, de colocá-la perto do ouvido, como se trouxesse consigo o som tão desejado e a sensação de areia no pé, ainda é algo que me pego repetindo. Tenho alguma lembrança distante da minha mãe me contando sobre esse efeito e da minha surpresa ao perceber a maré tão próxima, mesmo estando a quilômetros de distância de alguma praia.
A saudade das coisas, ou pessoas que amamos, faz o tempo parecer uma eternidade. Andar na beirada de espuma que se forma depois que a onda quebra, ter os pés lavados pela natureza, como se estivéssemos a brincar de pega-pega, correr da maré subindo e voltar para ela na mesma velocidade que estávamos a fugir. Parece que não há data certa para sentir isso de novo.
O silêncio do mundo que vivemos. Sinto falta dos sons tanto quanto qualquer outra pessoa. Essa ausência pode ser a oportunidade do amor aprender sobre o cuidado. O amor em nós, pelos outros, pelo toque nos grãos espalhados no chão do nosso dia a dia. Para que quando o reencontro aconteça, a intensidade dos nossos sentimentos seja multiplicada pela quantidade de dias que estivemos longe.
Nos alimentamos da memória enquanto a hora não chega. Castelos de areia, piscinas particulares (feitas de buracos escavados pelas nossas mãos), a toalha cobrindo o banco do carro, o ônibus quente ao meio dia, o cabelo com gosto de sal e o sono longo depois de um banho gelado após a volta para casa.
Enquanto o tempo não faz tudo voltar ao lugar certo, seremos constantemente lembrados do que sentimos longe dos lugares e pessoas. Ao colocar a concha pertinho de nós, é amor que sentimos. Naquela ligação demorada antes de fechar os olhos e sonhar, é o amor guardado para quando for possível ultrapassar portas sem medo. E será ainda melhor do que era antes, com esses novos olhos que ganhamos por aprender que a saudade ensina o cuidado.
Texto publicado em parceria com o Blog Quando Nuvem