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Trabalho

Profissão de trancista ganha reconhecimento oficial e impulsiona debate sobre regulamentação no Brasil

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Atividade que carrega significados culturais e movimenta o mercado da beleza passa a ter código próprio no Ministério do Trabalho e está no centro de projetos de lei em discussão no Congresso.

Foto: Juliana Dantas – Cedida

O Ministério do Trabalho e Emprego (MTE) reconheceu oficialmente a profissão de trancista, incluindo-a na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO), sob o código 5161-65, em maio de 2025. A medida é considerada um marco na valorização de uma atividade exercida, principalmente, por mulheres negras das periferias brasileiras.

A criação dessa CBO nasceu a partir da realidade vivida por muitas profissionais baianas, assim como outras mulheres que, há décadas, atuam em salões, comunidades ou mesmo em suas próprias casas. Mais do que uma função estética, as tranças carregam uma forte ligação com a identidade e a ancestralidade afro-brasileira, representando resistência, cultura e uma importante fonte de geração de renda.

“Comecei a trançar desde muito novinha, aprendi com minha vó. Sempre tive o cabelo cacheado e, na época, existiam pouquíssimas marcas para cabelos cacheados . Então, por ser prático para o meu dia a dia, adotei as tranças e levei para a vida. Iniciei profissionalmente há cerca de três anos, depois de fazer um workshop para aprimorar minha técnica”, relembra Juliana Dantas, trancista.

Essas profissionais exerciam seu trabalho sem reconhecimento formal e sem garantias de segurança profissional. Diante desse cenário, o MTE abriu diálogo com lideranças do setor, como o movimento Trançando Arte, que promove a valorização da cultura das tranças afro-brasileiras.

Para Juliana, as tranças vão além da estética. “Elas são um símbolo de resistência muito forte, mas também um agente de autoestima e empoderamento. Representam história, afrodescendência e cultura.”

Segundo o Sebrae, o setor da beleza movimentou cerca de R$ 173,4 bilhões no Brasil em 2024. As mulheres negras representam um público estratégico, promissor e em forte crescimento. A Afro TV (Brasil) e o Alma Preta Jornalismo apontam que o setor deve movimentar bilhões de dólares nos próximos anos, com expectativa de continuar impulsionando o mercado até 2034.

Projetos de lei em tramitação

Juliana Dantas – Foto: cedida

Dois projetos de lei que tramitam na Câmara dos Deputados buscam o reconhecimento formal da profissão de trancista. O PL 1747/2024, de autoria das deputadas Dandara (PT-MG) e Juliana Cardoso (PT-SP), propõe regulamentar o exercício da atividade no Brasil. Já o PL 2831/2024, apresentado pela deputada Rogéria Santos (Republicanos-BA), prevê a inclusão da profissão na Lei nº 12.592/2012, que já reconhece atividades como cabeleireiro, barbeiro, esteticista e manicure. Ambos os projetos aguardam parecer na Comissão de Trabalho da Câmara dos Deputados.

A oficialização trouxe um sentimento de conquista. “Fiquei muito feliz com a notícia, merecíamos ser reconhecidas por esse trabalho que é manual, artesanal e demorado”, comemora Juliana.

Arte que conta histórias

De acordo com registros históricos, as tranças sempre foram mais do que um penteado. Em comunidades africanas, indicavam origem, status social, idade e até rotas de fuga durante o período da escravidão. Hoje, representam afirmação identitária, autoestima e pertencimento.

Juliana lembra de uma cliente marcante: “Ela era muito insegura com o cabelo e fazia tranças justamente para se sentir bem e bonita. Sempre conversávamos sobre a importância dela se aceitar, até que um dia conseguiu cuidar do cabelo crespo dela com orgulho. Fiquei muito feliz de acompanhar esse processo que é tão difícil para nós, mulheres negras.”

Foto: Cedida

Desafios ainda presentes

Apesar do reconhecimento na CBO, os desafios para trancistas ainda persistem:
• Muitos profissionais atuam informalmente e sem acesso a direitos trabalhistas;
• Há dificuldades no acesso a crédito e capacitação profissional;
• Persistem o preconceito estético e o racismo em ambientes sociais e corporativos.

“Infelizmente, ainda há muito julgamento de quem não conhece o nosso trabalho. É comum ouvir frases como: ‘ah, mas você só faz trança?’. Ninguém fala isso sobre outras profissões, mas com as trancistas acontece”, critica Juliana.

Para ela, a regulamentação pode abrir caminhos importantes: “Espero que as pessoas passem a reconhecer mais a profissão, abandonem seus preconceitos e respeitem mais as/os profissionais.”

Perspectivas para o futuro

Com a inclusão da profissão na CBO, especialistas apontam que os projetos em tramitação podem ganhar mais força no Congresso. Caso aprovados, garantirão direitos previdenciários, regulamentação trabalhista e maior segurança jurídica para profissionais em todo o país.

A visão de Juliana é otimista: “A profissão só cresce. Muitas pessoas estão iniciando na carreira e enxergando nessa arte uma oportunidade para mudar de vida. Só tende a aumentar.”

E deixa uma mensagem para quem sonha em seguir esse caminho: “O início é difícil, solitário, mas não desista. Lá na frente você vai colher os frutos. Não escute as falas negativas, foque no seu progresso que tudo vai dar certo!”

Foto criada por IA
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